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sexta-feira, 20 de maio de 2011

Realidade paralela

Coloquei um espelho naquele canto vazio do quarto, desses grandes, onde se vê o corpo inteiro. Comprei baratinho em uma loja de penhores. Parei na frente dele e comecei a observar os detalhes do meu quarto e, obviamente, tudo estava ao contrário. Esse foi o primeiro dia.

No segundo dia havia algo de errado quando passei na frente dele. Meu pôster do AC/DC não estava na parede. Olhei pra parede real e confirmei que ele estava ali de fato. Deve ter sido algum efeito da cerveja que havia tomado. Apenas me deitei e dormi.

No terceiro dia eu estava sóbrio, e isso foi motivo de pânico quando olhei no espelho novamente. Onde antes estava o pôster do AC/DC havia um do Exaltassamba, onde antes estava minha guitarra agora havia um pandeiro. Minha estante de livros, gibis e criaturas em miniatura mudou de conteúdo: estava repleta de revistas de moda, produtos de beleza e uma pilha de CDs de pagode e sertanejo. Era o inferno.

No quarto dia não entrei no quarto. Dormi na sala. Minha mãe acha que sou louco.

No quinto dia tomei coragem e entrei lá armado de um pé de cabra. Tudo estava estranhamente normal dentro do espelho. Ele mostrava o quarto exatamente como ele é (mas ao contrário), nada de pagodices e boiolices. Suspirei aliviado e fechei os olhos para pensar um pouco.

Ao abrir os olhos, o medo tomou conta. O espelho voltou a mostrar aquele quarto demoníaco, e dessa vez eu havia mudado também. Minha calça preta e camiseta do Judas Priest se transformaram em um bermudão e uma camiseta branca justinha. Meu pescoço estava cheio de colares, minhas mãos cheias de anéis, minhas unhas estavam pintadas de rosa e meu cabelo tinha uma franja emo. Meu eu invertido sorria e me convidava para entrar lá e curtir a roda de samba.

Não sei qual a maldição desse espelho. Será que ele mostra o exato oposto do que somos? Será que é um portal para uma dimensão paralela? Será um castigo divino me condenando a sofrer com tudo que odeio?

Senti uma força me puxando para dentro do espelho. Pagode, moda, futilidades, vegetarianismo, transexualismo... tudo isso fará parte de mim se eu atravessar o portal para esse mundo. Em um esforço desumano juntei o pé de cabra e joguei com toda força no espelho. Ele estilhaçou-se em milhões de pedaços com o impacto fatal, e na mesma hora senti a restauração do equilíbrio. O espelho estava morto, e eu estava a salvo.

Juntei os cacos e coloquei no lixo. Nunca mais terei um espelho no meu quarto, essa realidade terrível não mais entrará em minha vida. Quem manda comprar coisas usadas, agora tenho sete anos de azar.

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